16.8.11

Solitude

Desde criança foi assim, sozinho, solitário, silencioso. Desde o dia do meu nascimento, que por pouco não foi o dia da minha morte. Desde a UTI. A incubadora. Desde quando meu pai me pegou no colo, ou na palma de sua mão como ele mesmo disse, eu parecia fadado. Nasci pardo, minúsculo, com uma pequena quantidade de cabelo liso na cabeça, olhos castanhos escuros. Nasci bebê. Nasci sozinho, pois nasci filho único, pois nasci o primeiro de quatro irmãos. E desde cedo eu já parecia levar jeito pra coisa. Essa coisa de ficar sozinho.

Depois de semanas na incubadora do hospital por complicações no parto, enfim fui para casa. Morava com meu pai e com minha mãe, e assim como eu, minha casa era minúscula com dois cômodos apenas. A casa ficava na Rua Egeu, num bairro bonito e tranquilo próximo a Avenida Atlântica. O quintal da minha casa era espaçoso, porque o quintal da minha casa era o trabalho do meu pai. Uma oficina mecânica. E desde aquele tempo eu ainda me lembro, eu parecia ser a única criança da rua. Posso estar errado, ali poderia ter mais crianças, talvez. Mas se realmente houvesse crianças na minha vizinhança, não fiz amizade com nemhuma delas. O fato é, eu não me lembro de criança nenhuma naquele lugar.

Então só me restava brincar sozinho, eu e meu mundo de imaginações. Meus primos moravam longe e me visitavam pouco. A maior parte do tempo era só eu e eu. Eu pulava, corria, dava risada e pelo contrário do que muitos costumam dizer "é impossível ser feliz sozinho" eu era feliz demais. Depois de um tempo a minha família se mudou para a periferia. A nova casa tinha agora 3 cômodos relativamente espaçosos e um quintal razoavelmente grande, não tão grande quanto o antigo quintal. Mas em compensação eu tinha a laje. Um espaço grande e vazio na parte de cima de casa. Era agora o meu novo playground solitário. A laje ficava no nível da rua, da rua podia-se ver minha laje e da minha laje podia-se ver a rua.

Na laje eu brincava de Superman ou de Batman ou de qualquer outro Super herói. Dava socos no ar para atingir criminosos imaginários, falava com pessoas imaginárias. Pessoas passavam na rua e me flagravam fazendo esse tipo de coisa. Um moleque sozinho na laje de casa conversando e brigando com pessoas invisíveis. Ganhei uma leve fama de louco. Por um período tinha quase certeza de que meus pais pensavam que eu era autista. Não só por ser sozinho, mas por não conseguir me enturmar com ninguém. A minha nova rua tinha crianças da minha idade. Mesmo assim, levou um tempo até eu me tornar mais sociável.

Estava começando a frequentar a escola, e estava ficando um pouco mais extrovertido, mas ainda quieto. Arranjei alguns amigos na minha rua, com quem começava a brincar. Tive uma inevitável recaída e os poucos amigos que tinha começaram a se distanciar. Eu simplesmente não gostava das coisas que eles gostavam, e eles não gostavam das coisas que eu gostava. Sempre têm sido assim. Meus primos, meus melhores amigos de sempre agora eram meus únicos amigos de sempre. Quando não estava completamente só, estava com eles. Percebi que conforme o tempo ia passando mais fechado e antisocial eu ia ficando. Me afundei tanto no meu problema social que nem via a adolescência passar. Ela veio e se foi. Quando vi já era tarde.

Meus primos arranjaram suas legiões de novos amigos e cada um tem sua vida agora. Eu não. Eles foram viver e eu fiquei no mesmo lugar que sempre estive. No mesmo lugar desde o meu nascimento. Parado, esperando não sei o quê. Acabei me fechando no meu mundo privado. Meu mundo particular. Onde é dificíl sair e dificíl de deixar os outros entrarem. Voltei a ser o moleque da rua sem crianças.

5 comentários:

  1. Que ótimo Andy, eu sempre quis voltar a ser criança, por mais dolorida (no sentindo literal da palavra) que tenha sido minha infância.
    Nada está perdido e você sabe, afinal tudo o que é psicológico vem de dentro e tudo que vem de dentro de nós, está então, sobre nosso controle.
    Beijo.

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  2. Você ainda é jovem, isto é, ainda há tempo.
    Sabe, eu gostaria de dizer coisas para te ajudar, mas... rs, eu preciso de ajuda tanto quanto voce nesse mesmo sentido.
    Boa sorte para nós.

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  3. Anônimo13:58:00

    Eu só sei de uma coisa, que o sofrimento você sente no momento, depois que passa fica um vão. Não existirá nenhuma lembrança, tipo de sentimento desse momento. Descobrir que a tristeza não leva a nada, vale a pena pensar um pouco, pensar em como agente poderia estar melhor, mas não prolongue muito. O que se deve fazer é sempre procurar a felicidade, que é a coisa mais importante da nossa vida. Fique bem.

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  4. oi... to cm preguiça mas eu li

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  5. Anônimo10:57:00

    Refleti bastante sobre a solidao ultimamente, estou fazendo intercambio por 3 meses e nao sei se estou gostando da experiencia... a solidao eh muito dificil, converso com as pessaoas mas eh algo superficial, falta contato social com pessoas significativas. Se bem que essa experiencia esta me fazendo refletir bastante e a me conhecer melhor tbm, so nao sei se gosto da pessoa que estou descobrindo ser.

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