26.4.16

A infeliz ironia da minha liberdade

Sou um grande fã da liberdade individual.

A liberdade que temos de fazer o que quisermos, como quisermos, quando quisermos; sem dar satisfação a ninguém, nem prejudicar a vida alheia. Ela é preciosíssima e fundamental para uma vida feliz e bem aproveitada.

Se a liberdade individual fosse uma pessoa, eu a pediria em casamento. Se fosse uma entidade, eu a adoraria como meu deus pessoal. Sério, como sou fã da liberdade individual

Assim, naturalmente, torno-me um grande inimigo de suas opositoras: censura, autoritarismo, dogmatismo religioso e comprometimentos sérios.

Com comprometimentos sérios, me refiro àquelas responsabilidades que mudam sua vida drasticamente, muitas vezes para sempre. Como casar-se ou ter filhos.

Pode parecer egoísta da minha parte, mas não é isso. Sou até bem altruísta. Me importo com as pessoas. Tento escutar, compreender e ajudar o máximo que posso. Mas gosto de estar solto, com o mínimo de responsabilidade me prendendo. Me sinto melhor assim. E você tem de se sentir melhor consigo antes de fazer o melhor para os outros. A liberdade é essencial para mim. Preciso dela para viver bem.

Me irrita muito ver pessoas terem sua liberdade cerceada por outras pessoas ou instituições. O que me frustra também, é quando se tem essa liberdade e não se sabe usá-la plenamente.

Hoje ainda me sinto preso dentro de mim. Enclausurado nos meus pensamentos. Desejos e vontades me queimam por dentro e, simplesmente, não sou capaz de colocá-los pra fora. Sei que sou o único ser que pode me salvar. E mesmo assim, sinto-me perdido. Muitas vezes não sei o que fazer e quando sei, não sei como fazer. É emocionalmente desgastante e desesperador viver nesta condição de ser o único carcereiro de sua própria cela.

Não sei usar minha liberdade plenamente e isso me preocupa. Porque sei que a vida é curta, e cada segundo não vivendo é um segundo morrendo. Já perdi inúmeras oportunidades na vida. Oportunidades de trabalho e de conhecer gente interessante. Perdi minha adolescência. Perdi muito tempo com essa inaptidão social, e temo perder mais.

Me frustra profundamente ver pessoas teoricamente menos livres que eu, conseguir aproveitar a vida com tão mais intensidade. Por exemplo, meus primos. Sou um pouco mais velho que a maioria deles e, a impressão que sempre tenho, é de que eles já viveram mais do que eu. Isso, por si só, já me deixa mal. O que me ajuda a deixar pior, é saber que todos eles são religiosos e eu não.

Não estou dizendo que religiosos deviam viver e se divertir menos - ou nem um pouco.

 A religião deles, sim.

Por mim, eles estão fazendo o certo. Vivendo suas vidas, aproveitando e se divertindo. Mas é inegável dizer que o dogmatismo religioso é um freio na liberdade. E que, quando sua crença diz que todo e qualquer prazer carnal é pecaminoso, pelo menos um peso na consciência eles devem sentir.

 Mas, ainda assim, eles vivem. Em contrapartida, eu, ateu, nada religioso, sem nenhum dogma para me frear e zero preocupação com um julgamento celestial, vivo como um monge semi celibatário.

Infeliz ironia da minha liberdade.

15.4.16

A beleza da falta de sentido

"Por que estamos aqui? Qual o sentido da vida?" pergunta você, pergunta eu, pergunta o ser humano. Acho que todos nós já fizemos essas mesmas perguntas pelo menos uma vez na vida.

Para muitos é difícil seguir caminhando sem uma direção sugerida, sem um mapa. Queremos um ponto de referência, um objetivo, uma razão para viver. Um destino a se chegar. É duro, para alguns insuportável, ao menos considerar a possibilidade de estarmos aqui por acaso, sem nenhum propósito definido. Por isso, muitos se apegam desesperadamente à uma crença religiosa - à procura de respostas reconfortantes. 

Bem, não acredito em um propósito definitivo. Acredito que não há nenhum sentido na vida em que vivemos. Nenhum sentido fixo. Porque nem ao menos acredito que fomos criados por uma inteligência superior.

Não há propósito nem destino. Nada está escrito ou predeterminado.

Tudo é caos.

Uma sucessão de eventos aleatórios. Sem ordem ou planejamento. Não há uma rota correta a se navegar. Estamos todos à deriva no oceano da vida. Parece assustador? Não, espere: está tudo bem! Aceitar a casualidade da vida não é nada ruim. É, na verdade, muito melhor. É libertador!

Estarmos à deriva não significa que devemos temer as ondas ou esperar algum barco salva-vidas vir ao nosso resgate. Que tal se, ao invés disso, escolhermos uma direção no horizonte e remarmos a esmo até avistar civilização, uma ilha tropical, uma festa num iate ou até um antigo e perdido reino inexplorado; irmos até lá e ver o que acontece dali pra frente?

Digo mais: e se o sentido da vida não for algo para procurar, e sim, criar? Manufaturar pra você mesmo?

Casar-se e ter filhos, ter sucesso profissional, ficar famoso, dar a volta ao mundo, sei lá. Acredito que cabe a cada um extrair da vida o seu próprio sentido.

Ter a consciência da eventualidade das coisas é dar mais valor a elas. Viver sem um caminho fixo e abrir opções para outros caminhos.

Essa é a beleza da falta de sentido: Não estarmos amarrados a um único propósito universal, e sermos livres para escolher.

14.4.16

Sobre ser contra o casamento gay

Sério, eu até entendo você ser contra o aborto ou a liberação das drogas.
Mas ser contra os direitos LGBT é, no mínimo, ser ignorante.

Não há UM bom argumento, UM bom motivo racional para ser contra o casamento gay!

Pense: ser contra o casamento homoafetivo é ser CONTRA A IGUALDADE!

Imagine você viver em uma sociedade que te discrimina e limita seus direitos somente por você ser quem você é! Não dá pra ver o quanto isso é injusto? Ou você não se importa com os outros?

Você não precisa ser gay para apoiar o direito dos homossexuais, basta ter o mínimo de empatia pelo próximo e o mínimo de senso de justiça!

Por isso simplesmente não entendo, não posso conceber alguém que se posiciona contra tudo isso.

Portanto pense de novo. Quando alguém perguntar: "você é contra ou a favor o casamento gay?", interprete a pergunta do seguinte modo: "você é contra ou a favor de uma sociedade mais igualitária pra todos?" e se mesmo assim você se declarar contra, bem, só resta três possibilidades:

1- Você é homofóbico. Sua ignorância sobre a comunidade LGBT te impede de ser mais tolerável e compreensivo com os mesmos. Talvez você tenha medo de conhecê-los mais de perto, talvez ódio, mas ambos, medo e ódio, são irracionais e infundados, uma vez que você nunca se deu a oportunidade de conhecer um gay melhor e ver que ele também é um ser humano como você.

2- Você é muito religioso. Talvez você nem seja preconceituoso, só tem receio de contrariar sua religião. Nesse caso, recomendo que pense com a própria cabeça. Não deixe um livro antigo tomar opiniões preconceituosas pra você. Mesmo se deus existir e tratar a homossexualidade como um pecado terrível, você acha isso certo? VOCÊ, VOCÊ, com sua própria cabeça, não acha isso injusto? Não acha que contraria as máximas de "deus é justo" ou "deus é amor"?

3- Você é homofóbico e religioso. Me desculpe, mas aí não vejo esperança para você...



Texto originalmente publicado no blog Raio X Mental.

À Noite

A noite é o completo exílio do dia.

 É quando o pai Sol sai para cuidar do seus outros filhos do outro lado do mundo, nos deixando à tutela da mãe Lua e suas estrelas.

 O Sol é aquele pai de abraço aconchegante e caloroso, mas que rege rigorosamente nossos deveres e responsabilidades diurnas. Nos proibindo, com rigidez, que saiamos para brincar antes da hora.

 Já a Lua é uma mãe mais fria. Fria, porém charmosa e libertária. Ela não só nos dá permissão para sair e brincar, como nos inspira a isso. Esse é o seu charme. É o charme da noite que seduz homens e mulheres, sérios trabalhadores de dia, para se libertarem à noite.

 A noite parece ser um mundo inteiramente novo. Um mundo de sombras, agora iluminado somente pelas luzes amareladas dos postes nas ruas, e as luzes neon de bares e hotéis. Esse ar noturno incita pessoas a sair, fugir do mundo de regras e obrigações que fora imposto a elas. Sair para esquecer, descarregar, satisfazerem seus desejos carnais, estancar o sangramento de suas almas.

 A noite faz isso.

 É uma mãe fria, mas surpreendentemente agradável. A noite pega nossas mentes e as arremessa para alto, na escuridão infinita e estrelada do céu sombrio. Jogando fora toda angústia, e nos deixando livres e preparados para mais um turbilhão caótico ao amanhecer de nossas vidas.



Texto originalmente publicado no blog Raio X Mental.

Mudei de opinião

Venho a você dizer que mudei de opinião. Não acho mais a vida uma merda. Como bom suposto pessimista que sou, "a vida é uma merda", era uma frase que usava com muita frequência, como um bordão. Até que um dia, em uma de várias discussões que tive com meu pai, o bordão veio mais uma vez: "A vida é uma merda!", meu pai me olhou triste como se estivesse cansado de ouvir aquilo, suspirou e disse: "Não dinho, a vida não é uma merda. A SUA vida pode ser uma merda, mas é só porque você quer." Não pude dizer mais nada. Não sabia o que dizer.

 Por dias fiquei com isso martelando minha cabeça, e, só aí, percebi o quanto fui estúpido. "A vida é uma merda" é uma frase tão ignorante e egoísta. Tão desproporcional. O quanto fui idiota! Toda e cada vez que usei esse bordão, eu fui um idiota.

 A vida é muito mais do que você vive ou viverá. É muita vida para uma avaliação tão simplista. Aprendi que a vida não é boa ou ruim, a vida é boa E ruim ao mesmo tempo. Acontece que quando se vive um certo número de experiências ruins, acaba-se acreditando que a vida é só ruim.

Sabe o que é a vida?

A vida é uma sucessão infinita de oportunidades dadas a você a cada segundo até que você morra. Na vida, coisas boas e ruins podem acontecer dependente e independentemente de você. Há coisas que você pode planejar e provocar e outras que são imprevisíveis e inevitáveis. Aprendi que momentos difíceis sempre virão, mas devem ser superados com a consciência de que oportunidades novas estão sempre surgindo, e assim, tudo pode mudar com uma atitude sua ou com um simples e inesperado acaso.

 Levei muito tempo para descobrir que muita da insatisfação que tenho é consequência do fato de eu somente existir e não viver. Quando se existe e não se vive, só se depende do acaso para que boas coisas aconteçam. Coisas ruins vêm com mais intensidade e você acaba fabricando humanos como eu: Pessimistas, sempre esperando próximas frustrações a vir.

Hoje vejo que a vida é algo imensamente preciosa e que deve ser vivida plenamente. Ser aproveitada ao máximo. Hoje eu entendo que, uma vez com essa oportunidade incrível nas mãos, - de viver a vida - deixar de participar desse evento espetacular não é só um erro muito grave, mas uma ofensa à vida em si.


Texto originalmente publicado no blog Raio X Mental.

Pós- morte

Nunca pensei que depois do fim haveria mais. Quando digo fim, quero dizer a morte. Chamo a morte de fim porque era o que eu acreditava ser.

 Sempre achei que após a morte não veríamos mais nada. Nem aquele clichê de ver sua vida inteira passar diante dos seus olhos, como um filme em fast forward. Sempre achei que depois do falecimento do nosso corpo só haveria escuridão. Um profundo vazio. Aí nossa consciência apagava, como uma vela sendo assoprada no escuro. Quando digo escuro, não me refiro à escuridão pós- morte que mencionei, e sim um escuro metafórico que usei para ilustrar o apagar da nossa consciência recém morta.

 Enfim, nunca acreditei em deus, ou no diabo, ou céu, ou inferno, ou na vida após a morte. Não só porque eu achava um tanto irônico(se é após a morte, não há mais vida), mas porque eu achava tudo isso um tanto improvável. Pensava que a vida fosse somente aqui e agora, não depois. Quando digo aqui e agora, me refiro ao meu antigo aqui e agora, no meu antigo estado de vivo. Porque no agora de agora, estou morto.

Morri porque fui tentar me matar...e não consegui. Não consegui me matar, mas consegui morrer. Subi num banquinho para me enforcar em uma corda, e, assim que senti a morte chegar, ali, pendurado pelo pescoço, desisti de morrer. Me chacoalhei em desespero, feito peixe que tenta se soltar do anzol. Minhas pernas se projetaram para cima e minha cabeça para baixo. A corda se rompeu. Morri porque caí de cabeça na quina do banquinho de madeira que subi para me matar.

Trágico. Inesperado. Ridículo.

Veja que até na morte eu sou uma piada. Acho que quando me acharam e perceberam como morri, riram de rolar no chão. O cara do necrotério deve ter rido de mim. No meu funeral deviam ser lágrimas de riso, não de tristeza. Acho que o coveiro não fechou meu túmulo pois não conseguia manejar a pá de tanta risada. Tantas formas mais heroicas e poéticas de dar fim à vida, e morro tentando evitar meu suicídio.

 Quando digo, "dar fim à vida", não é um fim literal, já que, neste exato momento, estou flutuando em direção à uma luz branca que fica cada vez mais forte. Nunca pensei que depois de morrer por fraturar o crânio em um banquinho de madeira haveria mais vida para ser vivida. Acho que agora acredito na vida após a morte, por mais irônico que esse termo soe. E acho que em dentro de poucos minutos, vou acreditar em deus, no diabo, no céu e no inferno, também. Por ter levado uma vida inteira cometendo o terrível pecado de não acreditar em um ser que nunca deu sinal de vida, acho que vou acabar indo pro inferno. Quando digo, "ser que nunca deu sinal de vida", não me refiro a deus apenas. Mas no diabo também. Aliás, não acreditar no diabo também é pecado?

Tenho a sensação que estou prestes a sanar essa dúvida. 



Texto originalmente publicado no blog Raio X Mental.

Amanhã eu vou mudar

Amanhã eu vou mudar.

 O dia nasceu nublado. O céu tá carregado. Parece que vem chuva aí. Acho que hoje não vai dar. Mas amanhã sim, amanhã será diferente.

 Então, havia me esquecido ontem. É que hoje tenho um compromisso inadiável. Hoje não vai dar de novo, mas amanhã vai ser o dia, eu prometo.

 Eu disse que hoje seria o dia. Eu até prometi, né? Mas sabe o que é? Fui convidado para uma festa de uns amigos meus. Não tô muito afim de ir, mas são amigos. Não posso fazer essa desfeita. Mas amanhã eu mudo, juro.

 É, vou ter que adiar aquela mudança mais uma vez. Jurei que ia ser hoje eu sei, eu sei. Você já devia saber que não sou bom com promessas. Lembra que eu tinha prometido essa mesma mudança alguns dias atrás e também não cumpri? Pois é, tenho que mudar isso também. Amanhã, amanhã será o grande dia. Cancelei todos os compromissos, recusei convites para festas. Amanhã será o dia da minha grande mudança e nada vai me impedir...

Acordei com uma baita gripe. Amanhã eu vejo esse negócio de mudança.

 Ah cara, vou ter que adiar essa mudança de novo. Não, não é nada, é que eu tô meio sem vontade hoje... Mas amanhã será diferente, você vai ver.

 Cara, você não vai acreditar: Meu chefe adiantou minhas férias. Isso quer dizer que nos próximos 30 dias estarei ocupado demais aproveitando meu descanso. É melhor deixar para mês que vem, mesmo. Anota aí: Mês que vem eu vou mudar.



Texto originalmente publicado no blog Raio X Mental

Stanley

Stanley parou para dar um gole no café. Viu Martin atirar uma bolinha de papel na cabeça do colega à frente. Depois viu o mesmo rir como uma criança de seis anos. Por uma fração de segundo, se sentiu no ensino fundamental de novo. Estalou os dedos doloridos e voltou à digitação frenética. Já era cinco e meia da tarde e nem a metade dos relatórios estavam prontos para a entrega. Stanley suspirou pesado e voltou ao trabalho. Digitar, salvar, imprimir. Digitar, salvar, imprimir. Digitar, salvar, impri... "Hahaha", um burburinho seguido de escandalosas gargalhadas cortou o fio de sua concentração. "Tá sujo de café", disse Lui ao passar. Stanley olhou para a solitária mancha escura no meio do branco de sua camisa e se perguntou como isso aconteceu. Não como a mancha aconteceu, mas como tudo aquilo aconteceu. Usar social, gravata e digitar em um computador o dia inteiro nunca fizeram parte de seus planos. Das pessoas ao seu redor, sim. Todos pareciam ter planejado cada pedaço daquilo para suas vidas tristes. Stanley voltou a lembrar da escola. Do tempo de criança, quando não haviam relatórios para entregar ou camisas manchadas de café para lavar. Quando não existiam problemas, responsabilidades. Ninguém quer responsabilidades, no máximo precisa-se delas. Stanley lembrou como desejava ser adulto quando criança. Só para poder fazer tudo que um adulto podia e uma criança não. Beber cerveja, ficar acordado até tarde, ver revista de mulher pelada sem a censura dos pais. Acontece que quando criança, você acha que a melhor coisa é ser adulto. Mas as desvantagens inundam as vantagens. Quando criança pensa-se não estar feliz o suficiente, mas você está, sim. Stanley se sentiu como uma negra mancha de café isolada na imensidão branca daquele lugar. Uma bolinha de papel cortou o fio de sua concentração. Era Martin outra vez. Agora, usando Stanley como alvo. Assim Stanley se sentou, suspirou pesadamente, estalou os dedos doloridos e voltou a digitar. Faltavam dez minutos para as seis. Stanley tinha que terminar os relatórios.


Texto originalmente publicado no blog Raio X Mental.

A Pessoa Mais Bonita do Mundo

Ontem eu acordei e era a pessoa mais bonita do mundo. Sério. Eu olhei no espelho e vi a pessoa mais bonita do mundo. Não imaginei uma miss, não imaginei Brad Pitt. Não era imaginação! Era a imagem da mais pura beleza. A minha imagem.

 Seria a luz da lâmpada fluorescente do banheiro que me iluminara errado? Seria o mofo do espelho  que tornara minha aparência mais agradável? Eu não estava mais dormindo, juro.

 Então lavei o rosto, esfreguei bem os olhos, tornei a me olhar no espelho. Inclinei-me para frente, serrei o olhar, Vi minha barba semi feita, a cicatriz no meu nariz de coxinha, minha semi monocelha grossa, a pele ressecada da minha imensa testa. Não pude acreditar. Era eu e o meu estúpido rosto de sempre. Tudo ainda estava lá, só que agora havia beleza. A maior beleza do mundo. Suspirei e me afastei do espelho. Sorri.

 Me senti bem pelo resto do dia. Me senti confiante. Fiz tudo que não pudera fazer antes. Dei um bom dia feliz e sincero às pessoas que passaram por mim. Ao padeiro do supermercado. À moça do caixa do banco. Ao meu vizinho. Pois me senti bem. Me senti confiante.

 Porque naquele dia eu era a pessoa mais bonita do mundo.
 Pelo menos só naquele dia.

 Só naquele dia.




Texto originalmente publicado no blog Raio X Mental.

Ânsia de Vômito

O que li noite passada me fez mal. Na hora foi bom, sempre é. Enquanto me deliciava com cada porção verbal, cada fatia de estrofe, toda saborosa frase, não imaginava tamanha indigestão que sofreria na manhã seguinte.
 Agora a flamejante ardência da azia queima a boca do meu estômago. Suco gástrico transborda o esfíncter esofágico e inflama as paredes do esôfago, criando bolhas de pus que estouram e se misturam ao viscoso líquido amarelado, me causando dores nauseantes. Me contorço e regurgito um jato de palavras nesse blog.


Agora me sinto bem melhor.



Texto originalmente postado no blog Raio X Mental.

7.4.16

Ah, o eterno retorno

Há 5 anos comecei o Blog Chato por puro tédio. Estava no meio das fárias da escola e não tinha absolutamente nada pra fazer. Adorava escrever,- ainda adoro - ansiava por atenção e contato humano, mesmo que virtual.

Passei a escrever textos numa quantidade absurda; divulgá-los pela internet e conseguir alguns fiéis leitores. Por pura empolgação produzia mais textos do que minha criatividade permitia, resultando em muito lixo postado aqui. Textos mal escritos, mal formulados, ideias imaturas. O constrangimento constitui 95% desse pobre blog. Fiz e desfiz amizade com leitores e, ocasionalmente, abandonava e voltava um tempo depois à escrita.

Há dois anos, mais ou menos, encerrei as atividades por aqui mais uma vez. Era uma decisão supostamente definitiva. A vida não tava legal. Inspiração zero, responsabilidades apertando, estresse, frustração. Precisava resolver meus problemas. A baixa autoestima e confiança - que refletiam diretamente no título do blog e na foto de perfil - estavam no seu ponto mais alto (ou mais baixo).

Coisas aconteceram. Poucas, mas aconteceram. Não sou exatamente o mesmo de dois anos atrás. Hoje conheço a mim e o meu problema um pouco melhor. Não melhorei tanto como queria ter melhorado, mas sou menos pior. E pretendo ser cada vez melhor daqui pra frente.

Sabe o que mais? Senti saudades de escrever.

Por isso, vou voltar a postar aqui, no Blog Chato, e jamais desistirei outra vez. Posso desanimar, ter um bloqueio criativo imenso que dure meses, mas sempre voltarei. Cedo ou tarde os textos virão. O título e a foto "deprê" permanecerão os mesmos para continuarem refletindo algo que ainda devo melhorar. Marcando assim, mais uma vez, meu eterno retorno.