14.4.16

Pós- morte

Nunca pensei que depois do fim haveria mais. Quando digo fim, quero dizer a morte. Chamo a morte de fim porque era o que eu acreditava ser.

 Sempre achei que após a morte não veríamos mais nada. Nem aquele clichê de ver sua vida inteira passar diante dos seus olhos, como um filme em fast forward. Sempre achei que depois do falecimento do nosso corpo só haveria escuridão. Um profundo vazio. Aí nossa consciência apagava, como uma vela sendo assoprada no escuro. Quando digo escuro, não me refiro à escuridão pós- morte que mencionei, e sim um escuro metafórico que usei para ilustrar o apagar da nossa consciência recém morta.

 Enfim, nunca acreditei em deus, ou no diabo, ou céu, ou inferno, ou na vida após a morte. Não só porque eu achava um tanto irônico(se é após a morte, não há mais vida), mas porque eu achava tudo isso um tanto improvável. Pensava que a vida fosse somente aqui e agora, não depois. Quando digo aqui e agora, me refiro ao meu antigo aqui e agora, no meu antigo estado de vivo. Porque no agora de agora, estou morto.

Morri porque fui tentar me matar...e não consegui. Não consegui me matar, mas consegui morrer. Subi num banquinho para me enforcar em uma corda, e, assim que senti a morte chegar, ali, pendurado pelo pescoço, desisti de morrer. Me chacoalhei em desespero, feito peixe que tenta se soltar do anzol. Minhas pernas se projetaram para cima e minha cabeça para baixo. A corda se rompeu. Morri porque caí de cabeça na quina do banquinho de madeira que subi para me matar.

Trágico. Inesperado. Ridículo.

Veja que até na morte eu sou uma piada. Acho que quando me acharam e perceberam como morri, riram de rolar no chão. O cara do necrotério deve ter rido de mim. No meu funeral deviam ser lágrimas de riso, não de tristeza. Acho que o coveiro não fechou meu túmulo pois não conseguia manejar a pá de tanta risada. Tantas formas mais heroicas e poéticas de dar fim à vida, e morro tentando evitar meu suicídio.

 Quando digo, "dar fim à vida", não é um fim literal, já que, neste exato momento, estou flutuando em direção à uma luz branca que fica cada vez mais forte. Nunca pensei que depois de morrer por fraturar o crânio em um banquinho de madeira haveria mais vida para ser vivida. Acho que agora acredito na vida após a morte, por mais irônico que esse termo soe. E acho que em dentro de poucos minutos, vou acreditar em deus, no diabo, no céu e no inferno, também. Por ter levado uma vida inteira cometendo o terrível pecado de não acreditar em um ser que nunca deu sinal de vida, acho que vou acabar indo pro inferno. Quando digo, "ser que nunca deu sinal de vida", não me refiro a deus apenas. Mas no diabo também. Aliás, não acreditar no diabo também é pecado?

Tenho a sensação que estou prestes a sanar essa dúvida. 



Texto originalmente publicado no blog Raio X Mental.

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